
Uma das melhores coisas de ser livreiro é estar a meio do trabalho de marca-preço-arruma-livro e não resistir a abrir um livro e aí ficar perdido. Assim aconteceu no outro dia com o poeta e excelentíssimo homem da cultura, Alberto Lacerda, pessoa fascinante que nasceu na Ilha de Moçambique (1928) e viveu entre Boston e Londres (onde morreu em 2007).
Hoje é dia Mundial da Poesia e o livro que se colou às mãos foi "Morte de uma estação", Antonia Pozzi (1914-1938), da editora Averno. No prefácio, a curta mas intensíssima biografia leva-nos a ler o pequeno livro todo de seguida e a querer ter conhecido a madura rapariga, que começou a escrever poesia aos 14 anos, e o seu círculo de professores e amigos, num meio italiano intelectualíssimo e vibrante.
Hoje é também o segundo dia de uma nova estação do ano, por isso fica Morte de uma estação, de Antonia Pozzi:
Choveu toda a noite
sobre as memórias do verão.
Ao anoitecer saímos
no meio de um ribombar lúgubre de pedras,
imóveis na margem segurando lanternas
para explorar o perigo das pontes.
Ao amanhecer vimos as pálidas andorinhas
ensopadas e pousadas sobre os fios
espreitando os sinais misteriosos da partida -
e reflectiam-nas na terra
as fontes de rosto desfeito.
Morte de uma estação, Antonia Pozzi, selecção e tradução de Inês Dias, ed. Averno, 17€